Panorama 2024-2025 de TI na América Latina: crescimento, IA em alta e a agenda prática do CIO
A IA saiu do hype e entrou na planilha: 63% das empresas latino‑americanas que usam GenAI já priorizam criação de novos produtos, enquanto 67% das lideranças no Brasil planejam elevar investimentos em...
A IA saiu do hype e entrou na planilha: 63% das empresas latino‑americanas que usam GenAI já priorizam criação de novos produtos, enquanto 67% das lideranças no Brasil planejam elevar investimentos em IA até meados de 2025. O desafio é desbloquear ROI além de chatbots — com dados governados, infraestrutura pronta e casos de uso ancorados em vantagem competitiva local.

Contexto rápido
O ciclo 2024-2025 consolidou um movimento que os CIOs já sentiam no dia a dia: TI voltou ao centro da estratégia e a IA migrou da apresentação para o P&L. No Brasil, o investimento total em TI chegou a US$ 58,6 bilhões em 2024, alta de 13,9% sobre 2023, dando ao país 34,7% do bolo latino-americano e a 10ª posição global em gastos de TI — com expectativa de novo avanço de 9,5% em 2025 (ABES, mar/2025; ABES, jul/2025). Na região, o setor deve crescer ~5% em 2024, com a “indústria de TI” (sem dispositivos) acelerando ~11% — Brasil +12%, México +10%, Chile e Peru +11% (IDC, dez/2023).
Curiosamente, o dinheiro novo não está indo só para “IA de vitrine”. Ele segue três frentes pragmáticas: modernização de infraestrutura (nuvem, dados), segurança cibernética e IA aplicada a produto e receita. É aí que a competitividade se decide.
Mercado e números: quem cresce e onde está o dinheiro
- Brasil lidera e acelera acima da média global. O país somou US$ 58,6 bilhões em 2024 (+13,9% vs. 2023), equivalente a 34,7% dos investimentos de TI da América Latina. A projeção é crescer mais 9,5% em 2025 (ABES, mar/2025; ABES, jul/2025). No detalhe de 2024: Hardware levou 47,6% (US$ 27,9 bi), Software 30,8% (US$ 18,0 bi) e Serviços 21,6% (US$ 12,7 bi). O Sudeste concentrou 60,8% dos aportes (ABES, jul/2025).
- Perspectiva regional 2024-2025. A região deve expandir ~5% em 2024; a indústria de TI (ex-dispositivos) ~11%, com Brasil +12%, México +10%, Chile e Peru +11%. A América Latina cresce, inclusive, com mais estabilidade que os EUA em 2024 (IDC, dez/2023).
- Capex digital crítico: nuvem, dados e IA. Os investimentos em plataformas de nuvem no Brasil devem atingir R$ 1,5 bilhão em 2024. O universo global de dados chega a 157 ZB no ano, com apenas 25% em nuvem — e o armazenamento em cloud cresce o dobro da velocidade do off-cloud (IDC/IstoÉ, 2024). Em GenAI, o gasto na América Latina deve alcançar US$ 120 milhões em 2024, dobrando sobre 2023 (IDC/IstoÉ, 2024).
Em termos simples: há orçamento, há urgência e há direção. Falta amarrar a execução a métricas de negócio — e a infraestrutura aos casos de uso que realmente diferenciam.
IA passa do hype ao ROI: casos e prioridades para 2025
Adoção ampla, foco em produto e receita. Na América Latina, 63% das empresas que já usam GenAI miram criação de novos produtos; 74% reportam ganhos de produtividade, e 79% investem mais de 10% do OPEX (despesas operacionais) em GenAI (Google Cloud/NRG, 2024). No Brasil, 98% das empresas experimentam IA em canais de marketing (Twilio, 2023), e 67% das lideranças planejam elevar investimentos em IA até meados de 2025, com a IA redefinindo a gestão de TI e operações (Deloitte Tech Trends 2025). O otimismo não é gratuito: 44% das companhias já veem resultados e 46% esperam impactos ainda em 2025 (SAP, 2025).
Ir além do chatbot. O recado dos analistas é direto: um chatbot, sozinho, não paga o 13º. O ROI aparece quando a IA “puxa” receita e margem com vantagem local: agentes para crédito e pricing dinâmico; antifraude com sinais comportamentais; cadeias de suprimento com previsões micro-regionais; atendimento omnicanal com contexto e consentimento bem geridos sob a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), quando o dado de cliente é central (Google Cloud/NRG, 2024; SAP, 2025).
“Como explica um gerente de CX, ‘sem dado vivo e governado, IA vira palpite caro’.”
Guardrails e execução. O gargalo está nos dados: integração, qualidade e governança travam a geração de valor com GenAI — tema destacado nas projeções da IDC para 2024 (IDC/IstoÉ, 2024). Em paralelo, duas táticas se consolidam:
- Adotar AI TRiSM (trust, risk and security management — confiança, risco e segurança) para mitigar viés, drift e vazamento de dados (Gartner, 2026 proj.; Deloitte Tech Trends 2025).
- Combinar LLMs (large language models) com SLMs (small language models): SLMs finos em dados proprietários para reduzir custo/latência e preservar IP, acoplados a LLMs generalistas via RAG (retrieval-augmented generation) quando necessário (Deloitte Tech Trends 2025).
Casos reais
A região começou a mostrar o que funciona — e onde. A lista de empresas mais inovadoras da América Latina de 2025 traz pistas claras:
- Alice: redução de 24% no tempo de triagem com IA, liberando médicos para decisões críticas (Fast Company, 2025).
- netLex: automação de contratos com LLMs/SLMs, acelerando ciclos jurídicos e reduzindo risco operacional (Fast Company, 2025).
- Nubank: entre as mais inovadoras da região, pela capacidade de escalar produtos com IA e dados (Fast Company, 2025).
- Beep Saúde: match inteligente entre pacientes e enfermeiros para vacinação em massa — mais de 22 mil pessoas vacinadas durante o surto de dengue (Fast Company, 2025).
- Bold (Colômbia): de adquirência a solução bancária completa em 2024 — expansão de produto ancorada em dados do comércio (Fast Company, 2025).
- Casa dos Ventos: projetos híbridos eólico-solar para estabilidade de geração — analytics como alavanca de CAPEX (investimento) (Fast Company, 2025).
- Vammo: estações de troca de baterias para motos elétricas — logística e telemetria no core (Fast Company, 2025).
- InPlanet: créditos de carbono com “intemperismo avançado de rochas” — ciência de dados e lastro técnico para monetização (Fast Company, 2025).
No Brasil interiorano, a conversa não é diferente. Em uma cooperativa do Oeste do Paraná, o piloto de previsão de safra com imagens e clima micro-local surpreendeu: a IA reduziu em 11% perdas logísticas em três meses ao reprogramar janelas de frete. Exemplo hipotético? Sim. Mas totalmente factível com dados disponíveis hoje.
Infra, nuvem e dados: a base para escalar (com segurança)
Modernização orientada por IA. A demanda por IA impulsiona chips especializados e processamento local para cortar latência/custo e proteger dados. O SENAI CIMATEC destaca a modernização da infraestrutura com investimentos em chips e arquiteturas otimizadas, além de cooperação academia‑indústria — exatamente a ponte que falta para saltos de produtividade (Deloitte Tech Trends 2025).
Multicloud, interoperabilidade e FinOps. A interoperabilidade em ambientes híbridos/multicloud deixou de ser “nice to have”. Ela é essencial para valorizar dados empresariais e evitar aprisionamento tecnológico — com FinOps (práticas financeiras de cloud) garantindo TCO (custo total de propriedade) sob controle. Vale lembrar: o investimento em plataformas de nuvem no Brasil deve alcançar R$ 1,5 bilhão em 2024; e os dados em cloud crescem 2x mais rápido que fora da nuvem (IDC/IstoÉ, 2024).
Cibersegurança como condição de crescimento. O Brasil lidera a receita de cibersegurança na América Latina e pode chegar a US$ 4,85 bilhões até 2027, com crescimento anual perto de 10%. Ao mesmo tempo, é o 2º país mais atacado do mundo — cenário que exige Zero Trust (confiar zero, verificar sempre), detecção e resposta gerenciadas e segurança para IA (TI.Rio/Mordor; GCI, 2027 proj.). Em outras palavras: sem segurança, não há IA em produção.
Capital e ecossistema: VC retraído, CVC mais estratégico
VC: cautela com foco em qualidade. No Brasil, o investimento de VC caiu de US$ 532 milhões no 4º tri de 2023 para US$ 341 milhões no 1º tri de 2024; o CVC recuou de US$ 268 milhões para US$ 62 milhões no período. A preferência migrou para trajetórias claras de lucratividade e rodadas mais seletivas (Quartz Capital/KPMG Venture Pulse Q1 2024). Sinal de fundo? Globalmente, o 2º tri de 2024 subiu para US$ 94,3 bilhões, puxado por megadeals e IA (KPMG Venture Pulse Q2 2024).
CVC amadurece e mira estratégia. Em 2024, o número de rodadas com participação corporativa caiu 31%, mas o capital aportado subiu 20%. A fatia corporativa chegou a 32% do total (US$ 2,6 bi), com 79% dos aportes fora do core — e protagonistas como Vivo, B3 e SoftBank (EY, 2024).
Exemplo hipotético (tese “bússola estratégica”): uma elétrica do Nordeste investe em uma startup de IA para observabilidade de ativos e expansão regional. Integração em 6 meses no SCADA (sistema de supervisão e controle industrial), contrato de fornecimento como alavanca e KPI de payback < 12 meses. A lógica é menos “aposta”, mais “piloto que vira linha de receita” (EY, 2024).
Inovação aplicada na região. A mesma lista que colocou Nubank, Bold, Alice e Beep Saúde em evidência também sinaliza onde capital encontra demanda real — energia híbrida (Casa dos Ventos), mobilidade elétrica com infraestrutura inteligente (Vammo) e carbono com ciência (InPlanet) (Fast Company, 2025).
Como operar aqui
- Ancore em vantagem local. Crédito com dados alternativos sob regras do Bacen? Supply chain com sazonalidade regional? Use o que só você tem. O “fosso” de dados — o moat — paga a conta de IA.
- Arquitetura pragmática. LLM generalista + SLM fino nos seus dados, com RAG e camadas de segurança (AI TRiSM). Latência e custo não são detalhes; são parte do produto.
- Governança de dados antes de mágica. Data products, catálogos, lineage, contratos de dados entre áreas. Sem isso, GenAI vira “demo bonita”.
- Métricas de negócio. Tempo de resposta, custo por chamada, delta de margem, NPS (net promoter score), fraude evitada. KPI em trimestre, não em ano fiscal.
Compliance e alertas
- LGPD é alavanca, não obstáculo, quando dados de cliente são centrais: minimização, consentimento e bases legais claras elevam a qualidade do dataset e reduzem risco reputacional.
- AI TRiSM em produção: monitorar viés, alucinação, drift de modelo e vazamentos; trilhas de explicabilidade e contenção de prompts sensíveis (Gartner, 2026 proj.; Deloitte Tech Trends 2025).
- Segurança by design: chaves, segredos e dados sensíveis segregados; auditoria de supply chain de modelos; política de retenção de logs de inferência; DLP (data loss prevention) em dados críticos.
Contraponto — quando não fazer. Nem todo problema é de GenAI. Se o processo é estável, altamente regulado e com pouca variabilidade semântica, regras determinísticas e analytics tradicional ganham em custo, auditabilidade e previsibilidade. Forçar GenAI onde não há dado vivo e retorno claro só cria custo fixo disfarçado.
Agenda executiva (90–180 dias): prioridades e métricas
- Dados primeiro
- Mapear fontes críticas, saneamento e lineage; criar 3–5 data products prioritários para GenAI; políticas de consentimento se envolver PII (LGPD).
- Checkpoint 90 dias: catálogo publicado, 60% dos domínios críticos com contratos de dados ativos.
- Checkpoint 180 dias: 70–80% dos dados prioritários “ML‑ready”; tempo médio de preparo de dataset < 2 semanas.
- KPI: % dados prontos para ML; tempo de preparo de dataset; taxa de reuso de data products.
- IA aplicada com SLMs e ROI mensurável
- Selecionar 2–3 casos de impacto direto em receita/custo (antifraude, recomendações, triagem clínica).
- Arquitetura LLM+SLM com RAG e contenção de dados; ciclo MLOps com avaliação humana.
- Meta trimestral: tempo de resposta p95 (percentil 95) < 800 ms; custo por chamada < R$ 0,02 (ajuste por caso); +2–3 p.p. em margem de contribuição do produto alvo.
- KPI: NPS por fluxo; delta de margem; taxa de conversão; custo por inferência.
- Infra e segurança para escalar
- Plano de chips/GPUs; inferência local vs. nuvem por caso (latência, custo, privacidade).
- Observabilidade de modelos e AI security; Zero Trust e DLP em dados sensíveis.
- KPI: SLA (service level agreement) de inferência; custo por mil tokens/execução; MTTR (tempo médio de recuperação) de incidentes.
- Multicloud, interoperabilidade e FinOps
- Padronização de APIs e dados entre clouds; política de portabilidade; práticas de FinOps para controlar TCO.
- KPI: custo unitário por workload; taxa de desperdício em cloud; tempo de portabilidade entre nuvens.
- Parcerias e capital
- Estruturar tese de CVC (corporate venture capital)/parcerias com metas de integração ao core; governança pós‑investimento definida no dia 1.
- KPI: % de POCs (provas de conceito) convertidas em contrato; payback < 12 meses; participação de receita com startups parceiras.
- Pessoas e capacidades
- Upskilling em engenharia de dados/ML e FinOps; squads com produto/negócio e metas compartilhadas.
- KPI: produtividade (features/quarter), tempo de ciclo de experimento, adoção interna por área.
O que medir a partir de agora
- Saúde do dado: completude, frescor, qualidade por domínio; % de dados com lineage rastreável.
- Eficiência de IA: latência p95, custo por inferência/chamada, taxa de alucinação controlada.
- Impacto no negócio: aumento de receita incremental, redução de churn, fraude evitada, eficiência operacional (tempo de ciclo e custo unitário).
- Risco e confiança: incidentes de segurança em IA, desvios éticos/viés detectados e tratados, conformidade LGPD.
- Disciplina financeira: TCO por workload; ROI por caso de uso em 90/180/360 dias.
“Como resume um CIO do varejo, ‘modelo que não mexe em margem é P&D, não é produto’.”